: é quando não se espera muita coisa que as piores
acontecem... Dito e quase feito. O centro da cidade é um lugar que se
reconhecem os mais (e menos) hilários transeuntes de todo um povo. É lá que
sentimo-nos perdidos numa selva de pedras decadentes pra ser bem clichê onde a
localização básica e ponto de encontro principal são as praças, provando a
natureza preguiçosa de uma comunidade, mano... Nesta tarde havia eu declinado
da ideia de querer fazer alguma coisa útil na minha vida, dito, e claro que não
feito: saí sem destino certo, o centro, e fiquei bestando (expressão utilizada
para designar uma pessoa que esta a esmo, sem foco, ou que tem sérios problemas
sexuais e que fica nas praças da cidade querendo um divertimento a todo custo).
Não era o meu caso neste dia. Havia ido para ficar sentado. Existe argumento
melhor? Vou a praça da cidade ficar sentado olhando aquela ruma de gente feia
passando de um lado para o outro, me estressando pelos do meu lado sentados que
ficam tirando melecas de orifícios ou falam alto enquanto comem e jogam restos
de comida em cima da primeira pessoa que estiver a seu lado, no caso, eu. Havia
eu me sentado. Estava eu lá. Com uma cara mais hibrida ou metódica possível.
Não queria que nenhum ser vivente neste mundo com capacidade de puxar conversa
chegasse do meu lado e fizesse o para que veio. Estava ali somente e queria que
fosse eu a pessoa mais invisível possível tenho dito o meu humor naquele dia
que só me deixava ser direto com alguém quando me perguntavam as horas, quando eu
respondia frio: são quatro e quinze, sem nenhum resquício de qualquer emoção ou
pessoalidade para quem me indagava esta pergunta infeliz e inoportuna. Estava
apenas, que é que custa não cutucar a suposta onça com a unha na ferida aberta
no céu da boca da mesma? Assim eu queria ser visto: um antipático, antissocial,
incrédulo, hibrido, transexual, invisível, chato, inoportuno, imprevisível,
doente, ruim, manipulador, frio, metódico, calculista, com dificuldades de
adaptação ao meio, detentor de uma serie de doenças cognitivas e fulminantes...
em outras palavras: não chegue perto, cachorro raivoso. Mas mesmo assim, um ser
advindo das profundezas do quinto dos infernos quis se chegar a minha pessoa.
Medi, claro, a repercussão caso eu desse logo a entender que eu não estava ali
para qualquer tipo de dialogo. Percebi logo, pelo jeito do mesmo falar que se
tratava de um fanho. Se eu tivesse
rejeitado aquele miserável com dificuldades de dicção estaria eu assinando o
termo pelo qual viabilizaria a abertura de explosões de xingamentos e olhares
fulminantemente recriminadores por estar se recusando a palavra a um irmão.
Podem introduzir no orifício da vã ciencia suas formalidades, não estaria ali
para adular e muito menos ser adulado, estava ali para simplesmente estar! Veio
ele com a seguinte pergunta: “que horas são?” “quatro e quinze” mais
rapidamente possível respondi aquela pergunta. Sem me preocupar muito com as
expressões faciais, já que pela rapidez já poderia ser notado que seriam poucas
e nulas as palavras que seriam trocadas caso se atrevesse a puxar assunto. A
sua voz fanha ficou ecoando na cabeça durante alguns segundos, motivo pelo qual
eu fiquei atordoado a ponto de saber de onde vinha, de como era produzida, a
que altura iria, quais seriam as notas daquela voz que ecoava na minha cabeça,
meu Jesus Cristo! Daí olhei-o. um erro na escala cinco onde iria a numeração
até quatro. Dei cabimento. Eu olhando para ele significaria inconscientemente
que eu estaria de alguma certa forma interessado no mais o que ele tinha a me
dizer. Baixei a cabeça em forma de arrependimento, mas ele não percebeu... Logo
falou: “é tanta gente né?” respondi: “é o centro da cidade, né? ¬¬”, ele: “fica
assim até de noite, né?” “até umas seis, NÉ?”. Ele olha pra cima e observa a lua. Estava de tarde mas a lua estava lá
sobre nossas cabeças. E, para o meu desespero, ele comenta: “lá em cima é que
deve ser calmo...”. Minha expressão facial não foi modificada, mas todos os
meus sentidos nesse momento se misturaram numa demonstração interna óbvia de
que aquele ser advindo das piores terras das províncias periféricas do quinto
dos infernos mexeu com meu eu. Silencio. Eu fiquei com aquela cara de paisagem,
ele, com a de lunático (literalmente) por mais meia hora. Neste tempo, as rolas
já haviam defecado nele, já havia se limpado e maldito as pobres aves daquela
praça. Mas nada que viesse chamar atenção no mais seria suficiente para me
tirar daquele estado traumático que eu me encontrava. Então ele se levantou,
fez “woohoo” com os dedos e disse um mole: “faloow” e foi embora. Seu andado
cauteloso, olhando para os lados, cabelos esvoaçantes, óculos de grau que
grudam armações de sol. Blusa branca e cagada, calça jeans desbotada, sapato,
não lembro... tive coragem e fui pra casa. Por que eu saí de lá?
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